sábado, 11 de junho de 2011

CASAIS PERFEITOS


Casais perfeitos....
Eu não acredito nisso nem por cinco minutos.

Ivan Martins

É editor-executivo de ÉPOCA

Não sei quanto a vocês, mas eu desconfio de casais 

perfeitos. Minha experiência sugere que eles não existem. 

Ao fim do meu relacionamento mais longo, que tinha se 

tornado intolerável, amigos próximos diziam: “Nossa, vocês 

pareciam tão bem”... Na minha segunda relação duradoura, 

que foi mais feliz, as pessoas comentavam, ao final: “Ah, 

mas vocês eram tão diferentes...”. Nos dois casos, ninguém 

tinha percebido nada. Na primeira vez parecia harmonioso 

e não era. Na outra havia aparência de conflito, mas ele 

não existia. 

Com base nessa limitada experiência, casais que transpiram 

felicidade pública me deixam cético. Aprendi que as 

pessoas fingem bem-estar e harmonia, como interpretam 

tantas outras coisas que dão prestígio social. Pega mal 

fazer parte de um casal que vive às turras, que não dá 

certo, que passa uma imagem de infelicidade e derrota. 

Logo, as pessoas criam uma imagem de felicidade para 

consumo externo. Na intimidade ninguém sabe mesmo o 

que se passa. 

Essas coisas me ocorreram ao ver Angelina Jolie na capa 

da revista Vanity Fair, falando do seu casamento de 

sonhos com Brad Pitt. Os dois são lindos, ricos e famosos. 

Viajam pelo mundo com suas seis crianças multirraciais. 

Quando ela faz um filme, sempre em lugares espetaculares 

como Veneza, ele acompanha e cuida das crianças. Quando 

ele filma, ela se torna mãe de tempo integral. Ah, sim: já 

falei que eles são lindos, ricos e famosos? 

Eu não acredito nessa história nem por cinco minutos. É 

evidente para mim que casar a atriz mais bonita do planeta 

com o ator mais bonito do mundo não dá certo. Parece o 

roteiro de um conto de fadas. Parece o delírio de um 

relações públicas da Sony. É como se alguém pegasse os 

dois primeiros alunos da escola e os casasse. Ou montasse 

um casal com o artilheiro do time de futebol e a miss da 

cidade. No papel essas coisas parecem bacanas, mas na 

vida real quase nunca funcionam. 

Um dos casais mais duradouros do cinema foi formado por 

Elisabeth Taylor e Richard Burton. Eram os Brangelina dos 

anos 60 e 70, com uma enorme diferença: juntos, 

produziram um furacão de sexo, álcool, luxo e escândalos. 

Burton era filho de mineiros miseráveis do País de Gales. 

Liz Taylor era a atriz mirim que cresceu diante das 

câmeras para ser a namorada da América. Tinham em 

comum somente a profissão de ator e o temperamento 

apaixonado. Viveram no amor as consequências naturais de 

uma vida pública de excessos. Ele caia de charme e ela de 

beleza, mas jamais foram perfeitos. Eram de verdade. 

Eu olho para a vida das pessoas que me cercam e tenho a 

impressão de que as relações verdadeiras repelem as 

semelhanças. Casais interessantes são como o piano e o 

violino, a dama e o vagabundo, a bela e a fera. Divergem, 

destoam e se completam. Tenho a impressão de que apenas 

casais muito jovens são formados por gente da mesmíssima 

procedência. Quem teve a chance de andar pela vida, em 

geral escolhe fora do seu clã. Busca diferença e 

complementação. Procura o novo. 

Eu tenho a sorte de conviver com estrangeiros. Percebo a 

naturalidade com que se montam arranjos dissonantes. O 

gringo loiro se apaixona pela moça brasileira que nada tem 

em comum com o estilo de vida dele. Funciona. O moço 

argentino se casa no Brasil e nunca mais vai embora. O 

mesmo acontece com muitas mulheres brasileiras na 

Europa. Ou europeias no Brasil. Essas uniões improváveis 

celebram a diversidade humana e atendem ao desejo das 

pessoas de se aventurar. Nem todos podem ser Cristóvão 

Colombo, mas todos podem transformar a sua vida 

emocional em uma grande descoberta. Navegar é preciso. 

Para andar longe na vida, porém, ajuda livrar-se do peso 

dos estereótipos. Se todo mundo quiser ser o casal 

Brangelina, as possibilidades tornam-se limitadas. Não há 

beldades tatuadas disponíveis para todos. Nem bonitões 

milionários de ar meigo esperando em fila na próxima 

esquina. Esse é um sonho padrão, oferecido globalmente 

como um sanduíche Mcdonalds. 

Quando se trata de afeto e relacionamento, melhor é cada 

um achar sua própria receita. A mulher que lhe cai bem, o 

sujeito que a deixa feliz. A percepção dos outros é menos 

importante do que os nossos sentimentos. O par perfeito 

aos olhos dos amigos pode ser fonte de tédio e 

aborrecimento. O arranjo de aparência harmoniosa que 

confere prestígio pode ser um desastre íntimo. 

A mim ajuda lembrar, na hora de fazer escolhas, que casais 

perfeitos não existem: eles ficam bem nos filmes e 

ilustram divinamente a capas de revista, mas devem ser 

uma droga na vida real.

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